segunda-feira, 21 de junho de 2010

O Escritor (parte II)

Continuação do conto. Não sei se eu deveria ter postado isso tão cedo, até porque não tenho certeza se tem muito mais pela frente. Paciência.
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Antes de prosseguir com esta narrativa, devo lhes dar uns pequenos avisos. Sabendo que a arte (seja ela sob a forma de escrita, música ou qualquer outra maneira) é quase sempre vítima de clichês, tanto por parte de quem a faz quanto por quem a aprecia, sinto-me na obrigação de avisar que isto não é uma história de amor. Talvez eu tenha frustado suas expectativas em relação a um grande romance, mas pelo menos não esperei até o final para dar a cruel noticia que aqui se apresenta. Devo admitir também que pelo que falei até agora sobre a protagonista ela aparenta ser a garota perfeita. Não se enganem. Ela é uma mulher como qualquer outra: tem desejos, vontades, defeitos (esses provavelmente superam as qualidades) e dá muito valor para coisas materiais no geral. Também, como a grande maioria, quer um homem lindo ao seu lado (e de preferência de grandes dotes). Não suporta muitas coisas e acredita piamente que a humanidade não tem salvação; São (quase) todos egoistas e instintivamente maus. Porém isso não a faz melhor ou pior do que ninguém. Isso não significa que Ana não possa ser encantadora (e não posso se encantar), mesmo que a seu próprio modo (como vimos até agora). Peço perdão caso alguém tenha se decepcionado mortalmente com as coisas que acabo de dizer, mas prefiro que estejam avisados para não serem pegos de surpresa. Expectativas frustradas são uma das piores coisas que existem.
Com os avisos dados, posso dar continuidade.
No dia seguinte o escritor reapareceu. "Graças a Deus" pensou Ana (apesar da estranheza que a frase lhe proporcionava. Força de hábito). Assim como no dia anterior, ele fizera exatamente o mesmo pedido e continuou a escrever no mesmo livro, que, notou Ana, tinha uma linda capa feita de couro ou algo que o valha. Era impressionante como ele nem levantava a cabeça, parecia que o texto já estava completamente pronto em sua cabeça, só estava passando para o papel. Ela não duvidava que fosse isso mesmo.
No final do dia pagou e foi embora, mais uma vez. E foi assim durante várias semanas. Nada parecia se mover ou quebrar aquela rotina. Mas isso era maravilhoso para ela. Quanto a ele... bem, ele não parecia nem notar que os dias se passavam.
Um dia ela acordou e o dia estava cinzento, chuvoso, como se fosse um mau agouro. Teve um pouco de receio de sair de casa, mas sabia que devia ir trabalhar. Foi, e apesar do dia incomum para a época do ano, o escritor novamente apareceu. No entanto, aquele dia ele pelo menos teve a iniciativa de pedir o que comer. Pediu uma fatia de torta de chocolate, o que desapontou um pouco Ana, achando que sua sugestão havia lhe desagradado. "Pelo menos tivemos um avanço" pensou enquanto preparava o café. Notou que pela primeira vez ele parecia estar um pouco desnorteado em relação a sua história, seja lá o que estivesse escrevendo. Naquele dia ele parecia perdido, o que obviamente lhe causava sofrimento. Parecia estar preocupado. Parecia, enfim, um ser humano de verdade. Olhava para todos os lados, talvez procurando inspiração ao seu redor. Até que uma hora os olhares de ambos se encontraram. Ele com uma expressão que parecia perguntar "o que faço agora?". Ela simplesmente suspirou e fez uma cara de pena, como se respondesse que não sabia, que não tinha como ajudar. Esse foi o primeiro contato entre os dois que não fosse meramente "mais café por favor", "pois não". Ana rapidamente desviou os olhos (nunca conseguimos sustentar olhares por muito tempo, é inerente ao ser humano) e virou-se para pegar qualquer coisa que estivesse ao alcance da mão, meio sem graça pelo momento. Apanhou um xícara de café e quando se virou para leva-la até a mesa acabou tropeçando e derramando o conteúdo na camisa de um senhor. Ela pedia desculpas incessantemente, enquanto limpava a sujeira com um paninho úmido. O velho apenas sorria, dizendo que não havia sido nada (na verdade sentia-se muito bem, nem lembrava quando fora a última vez que uma bela senhorita havia lhe dado tanta atenção). Ana olhou de esguelha para o escritor e percebeu que ele sorria, maravilhado com a cena. Ruborizou-se quando viu que ele baixou a cabeça e começou a escrever novamente, como que tomado por um espírito inspirador. Agora ele dera para escrever sobre ela? Que direito que ele tinha de fazer isso? Ana sentia-se invadida. Porém não conseguia fingir raiva, a situação aumentava seu ego imensamente. Sentia-se de certa forma lisonjeada por servir de inspiração.
Quando voltou para casa aquele dia, pegou uma folha de papel e começou a escrever várias idéias e temas para livros, esperando encontrar em um desses o que era usado pelo escritor. Não tendo como saber, resolveu utilizar aquilo tudo. Logo mais estava escrevendo suas próprias estórias. Trocara o hábito de ler pelo de escrever.

Um comentário:

Julia 'ins'pirando disse...

gostei bastante do começo da segunda parte '-'