segunda-feira, 28 de junho de 2010

Michel de Montaigne, o brigão

Sai da aula e fui em direção a parada de ônibus. No meio do caminho comprei um café, enquanto pensava o que diabos eu ia fazer pra tocar aquela maldita invenção de Bach, que mais parecia obra do demônio do que de um músico. Enquanto ia para a parada vi meu ônibus passando. Terceira vez no dia. Ótimo, teria que esperar mais um monte de tempo. Porque mesmo eu não comprei uma carteira de cigarro? Ah sim, eu estava tentando parar. Estava. Acabei conseguindo um com uma alma caridosa que estava por ali. Dizem que cigarro não se nega...
Por sorte não demorou demais. Minha barriga já começava uma revolução, pedindo comida desesperadamente. Entrei, passei pela roleta e sentei no banco da janela. Fechei os olhos por um momento. A rápida sequência de notas, uma atrás da outra, ainda se repetia na minha cabeça, enquanto meus dedos começavam a doer só de pensar naquilo. Quando minhas pálpebras se abriram novamente, vi que algumas pessoas estavam entrando no ônibus. Primeiramente passou pela roleta uma menina muito bonita. Logo atrás veio um cara de cabelinho espetado e cara de babaca. Óbvio que ele era namorado da bonitinha, que dúvida. O casal ainda sentou bem na poltrona da minha frente. Voltei a olhar para a janela, ignorando o resto do mundo.
Mais uma leva de passageiros em uma parada mais a frente. Dessa vez duas amigas e um careca de óculos com um livro de capa grossa na mão. Interessado em saber o que ele estava lendo, fiquei tentando olhar, mas ele fazia muitos movimentos com o braço. Sentou na poltrona do lado oposto de onde estava o casal. Consegui então ver o título em dourado na capa verde do livro. Era, pelo visto, um livro sobre Montaigne. Já tinha ouvido falar desse nome, mas não sabia exatamente quem era. De um jeito ou de outro o careca lia com um disfarçado interesse, como se procurasse algo além do livro. Voltei meu olhar para as amigas que agora estavam sentadas na frente do casal, duas poltronas a frente da minha. Fixei meu olhar no cabelo de uma delas e voltei a viajar, tentando imaginar Bach tocando uma peça num cravo ou algo assim. Como era dificil, porque apesar de conhecer o rosto dele de pinturas eu simplesmente não conseguia imaginar aqueles dedos gordos como salsichas correndo pelo instrumento com velocidade e precisão incomparáveis, de modo que nem se visse direito o que estava sendo feito. Alias, como eram estranhas aquelas perucas brancas que se usavam. Poxa, não seria mais fácil se...
-Tá olhando o que?
A voz desafiadora me despertou do transe de pensamentos infundados. Vi que quem tinha falado isso era o careca, que olhava fixamente (apesar dos óculos) para o namorado da menina bonitinha.
-Que o que?, respondeu o garoto. Apesar da estranheza de sua frase eu não consegui rir, já que estava tentando prestar atenção na discussão.
-Fica te achando malandro com esse cabelinho ai, disse o careca.
-E tu com isso?, disse o garoto, enquanto apontava para a cabeça de ovo do outro.
A namorada não falava nada, talvez pensando como o namorado era idiota por discutir com um careca no ônibus. Ou o estava achando o máximo.
-A gente não precisa aturar essa tua falta de educação!
O careca tentou voltar a ler, mas o garoto deu uma risadinha sarcástica que óbviamente o irritou. Fechou o livro e o botou na poltrona ao lado (pobre Montaigne, trocado por uma briga). O que um cara daquele tamanho queria com um pirralho daqueles? Era provavelmente o meu pensamento e o do resto dos passageiros. A tensão aumentava e o careca bufava. Por um momento a maldita invenção de Bach saiu da minha cabeça. Aquela cena era muito mais divertida.
O ônibus pareceu voltar ao normal aos poucos. Quando todos pensavam que a confusão tinha acabado, o homem se jogou para cima do garoto, derrubando o livro no chão. Ignorando a menina que finalmente começava a reagir com gritos de "para! Para com isso!", o careca desferia socos por ai, tentando acertar a cara dele. Rapidamente o cobrador segurou o homem pelos braços, jogando-o novamente para sua poltrona. Arrumou a sua camisa e só disse "a gente vai descer junto, só espera".
Minha parada era a próxima. Desci e comecei a caminhar de volta para a casa. Na minha mente um único pensamento: como eu ia fazer para tocar a maldita invenção de Bach?
Baseada em fatos verídicos... Pelo menos até uma parte.


Ouvindo Mudhoney-Touch Me I'm Sick

domingo, 27 de junho de 2010

Pensamentos... uma pilha deles

Ai ai, pensar demais não é a melhor coisa que existe, mas o mundo ao redor de nós nos obriga a isso. Não, não vou falar sobre a fome na África ou sobre a corrupção no país, são assuntos bem mais importantes e relevantes (será?). Pensei em tantas coisas esses últimos tempos que decidi fazer uma pequena compilação desses pensamentos aqui nesse post. Muitas coisas vocês nem vão entender, mas dane-se. No fim acho que será apenas um grande desabafo (isso esta quase virando um diário... droga).
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Conheço muita gente que está servindo no exército. Eu, ainda bem, não tive que servir, não só pelo cabelo, mas porque aquilo aliena a criatura. Sério mesmo, todas as pessoas com quem conversei até hoje e que estão servindo só falam disso. Só. Eu sei que isso toma muito tempo e tal, mas calma né? Tudo que é falado elas relacionam com exército. Pior é quando tentam ensinar algo do quartel para as pessoas "normais".
Mas tudo bem, eu até gosto de falar sobre, sempre dá assunto pra conversa (não sou muito bom em começar uma interessante, portanto, se vierem falar comigo, puxem vocês o assunto).
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Viver do passado é uma droga. Viver do passado dos outros é pior ainda, porém é bem mais interessante. E muitas vezes constrangedor.
Eu poderia ficar horas e horas dissecando as coisas que as pessoas fizeram, vendo como mudaram e porque. O grande problema da internet é que podemos tirar conclusões meio erradas das coisas, mas isso acontece o tempo inteiro. Fazer o que.
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Meu deus! Será que sou apenas mais uma memória na mente de alguém? Ou será que nem isso? Não sei explicar isso direito, mas eu gosto de fazer diferença na vida das pessoas, de preferência de uma maneira positiva, mas nem sempre dá certo, e na maioria das vezes a culpa é minha mesmo. To virando emo.
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Hum...
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Impressionante como pessoas diferentes se atraem. Isso é MUITO interessante. Não quero pessoas iguais a mim por perto, na minha vida já basta eu!
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Gostaria de ler a mente das pessoas.
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Começo a me arrepender amargamente de coisas que fiz (e eu achando que só me arrependia do que não tinha feito), porque, afinal de contas, ações aleatórias as vezes causam desconfiança.
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Lálálá.
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Porra, eu quero a merda da minha banda ensaiando novamente!!!
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Merda de post, um dia irei me arrepender dele, certamente. Mas enfim, guardarei para posteridade.
Outro dia posto mais pensamentos. Isso é terapêutico.
Até mais.
Ouvindo 4 Non Blondes-What's Up

terça-feira, 22 de junho de 2010

O Escritor (parte III)

Última parte do conto. Espero que gostem.
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Os dias foram passando sem mais nenhuma surpresa. Ana notou certos hábitos do escritor como, por exemplo, o fato de sempre pedir torta de chocolate em dias chuvosos, enquanto no restante ele deixava a escolha para quem o servisse. Todas as terças-feiras usava um sapato marrom. Chegava sempre as quinze para as três da tarde, menos nas sextas-feiras, quando aparecia com dez minutos de atraso em relação aos outros dias. Sempre nos dias quinze e dezenove de cada mês o escritor usava um chapéu e entrava no café com o pé esquerdo. Nas quintas-feiras, assim que ele entrava, dava uma olhada ao redor e sentia um calafrio. Sempre as dezesseis horas, vinte e seis minutos e dezesseis segundos de cada dia ele batia o pé direito no chão. Todos os dias, durante meia-hora, ele inclinava a cabeça levemente para a direita e ficava marcando algumas palavras no texto com um lápis. Sempre bebia seu café como se fosse o último, apreciando cada gota. Nunca botava açucar na sua bebida. Nas segundas (o dia favorito de Ana), ele sempre entrava sorrindo. Anotava cada um desses detalhes em um bloco de notas, obcecada por descobrir cada vez mais peculiaridades sobre aquele estranho ser. Mas mesmo sabendo muito sobre ele, notou que não sabia nada. Quem era ele de fato? Qual o seu nome? O que ele escrevia com tanto afinco? As vezes até duvidava de sua capacidade literária, afinal de contas um homem tão regrado e cheio de manias não parece ter uma criatividade muito aguçada.
Com o tempo as excentricidades foram rareando, já tendo uma lista com mais de cinquenta manias. Começou a sentir falta de novidades, era tudo tão previsível. Queria descobrir algo novo, algo de realmente útil, algo que não fosse o tipo de gravata que ele usava em um certo dia ou a que horas ele pedia a segunda xícara de café. Queria algo concreto, algo que fizesse a diferença, algo que fizesse ela conhecer aquele homem de fato. Mas sabia que nunca ia chegar a lugar nenhum se apenas ficasse observando tudo de trás daquele balcão. O problema é que não tinha coragem, nunca tivera. Agora precisava disso.
Preparou-se durante semanas para o momento do embate. Estava se preparando para lutar contra si mesma e estava disposta a ganhar. Um dia ela simplesmente foi até lá e perguntou o que ele estava escrevendo. Nunca soube se foi movida por curiosidade ou algo mais intenso, só sabe que foi. Assim que ela fez a pergunta o escritor arregalou os olhos. Parecia incrédulo. Não entendia o porque da pergunta, ninguém nunca o fizera. Achava que essa pergunta nunca deveria ter sido feita, pois achava que a magia de tudo estava justamente no mistério. Ficaram olhando um para o outro durante alguns minutos, até que o escritor, sem dizer palavra, levantou-se e saiu de lá com o livro debaixo do braço. Ana estava atônita demais para dizer, pensar ou fazer qualquer coisa. Tinha feito alguma coisa errada? Falou algo que não deveria ter dito? Ela não encontrava resposta para nenhuma de suas perguntas, apenas sentia um imenso vazio. Então simplesmente pegou a xícara pela metade de café, o pratinho com a fatia de torta sem um pedaço e voltou para o seu posto. Não falou mais nada durante o resto do dia.
A cada dia que passava sofria mais e tinha o seu culpado: o maldito escritor. Porque ele foi aparecer na sua vida? Somente para faze-la sofrer. O que ela não imaginou é que talvez ela tivesse interpretado de maneira errada as atitudes dele. A raiva, apesar de libertadora, não nos deixa pensar com clareza.
Os meses foram passando e ela foi lentamente esquecendo de tudo. No começo foi difícil, mas dizem que o tempo cura tudo. Assim foi. Claro que ela nunca esqueceria de fato, afinal, apesar do pouco tempo de convívio, o escritor mudou sua vida de maneira impressionante... Só não gostava de admitir isso.
Foi então que em mais um daqueles dias chatos atrás daquele balcão que chegou algo que mudaria sua vida novamente e que a faria lembrar de tudo que acontecera. Um homem do correio surgiu na porta da cafeteria anunciando uma entrega para a senhorita Ana. Ela se surpreendeu e se identificou. Assinou um papel e pegou um embrulho vermelho em formato retangular. Abriu com todo cuidado, apesar da pressa e quando tirou o presente do embrulho reconheceu de imediato o livro que tanto tivera curiosidade de ler. Na capa de couro havia apenas uma coisa escrita, em letras douradas: "Retratos". Nenhum bilhete ou dedicatória, nada. Aquele dia quando voltou para casa devorou o livro em apenas um noite. Tratava-se de uma compilação de vários contos sobre pessoas de todos os tipos, todos contados de uma maneira apaixonada, como se essas pessoas fossem as coisas mais importantes do mundo. Ana estava maravilhada com o livro e se arrependeu profundamente de tudo que pensou sobre o escritor, ainda mais quando leu o último conto: Ana.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

O Escritor (parte II)

Continuação do conto. Não sei se eu deveria ter postado isso tão cedo, até porque não tenho certeza se tem muito mais pela frente. Paciência.
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Antes de prosseguir com esta narrativa, devo lhes dar uns pequenos avisos. Sabendo que a arte (seja ela sob a forma de escrita, música ou qualquer outra maneira) é quase sempre vítima de clichês, tanto por parte de quem a faz quanto por quem a aprecia, sinto-me na obrigação de avisar que isto não é uma história de amor. Talvez eu tenha frustado suas expectativas em relação a um grande romance, mas pelo menos não esperei até o final para dar a cruel noticia que aqui se apresenta. Devo admitir também que pelo que falei até agora sobre a protagonista ela aparenta ser a garota perfeita. Não se enganem. Ela é uma mulher como qualquer outra: tem desejos, vontades, defeitos (esses provavelmente superam as qualidades) e dá muito valor para coisas materiais no geral. Também, como a grande maioria, quer um homem lindo ao seu lado (e de preferência de grandes dotes). Não suporta muitas coisas e acredita piamente que a humanidade não tem salvação; São (quase) todos egoistas e instintivamente maus. Porém isso não a faz melhor ou pior do que ninguém. Isso não significa que Ana não possa ser encantadora (e não posso se encantar), mesmo que a seu próprio modo (como vimos até agora). Peço perdão caso alguém tenha se decepcionado mortalmente com as coisas que acabo de dizer, mas prefiro que estejam avisados para não serem pegos de surpresa. Expectativas frustradas são uma das piores coisas que existem.
Com os avisos dados, posso dar continuidade.
No dia seguinte o escritor reapareceu. "Graças a Deus" pensou Ana (apesar da estranheza que a frase lhe proporcionava. Força de hábito). Assim como no dia anterior, ele fizera exatamente o mesmo pedido e continuou a escrever no mesmo livro, que, notou Ana, tinha uma linda capa feita de couro ou algo que o valha. Era impressionante como ele nem levantava a cabeça, parecia que o texto já estava completamente pronto em sua cabeça, só estava passando para o papel. Ela não duvidava que fosse isso mesmo.
No final do dia pagou e foi embora, mais uma vez. E foi assim durante várias semanas. Nada parecia se mover ou quebrar aquela rotina. Mas isso era maravilhoso para ela. Quanto a ele... bem, ele não parecia nem notar que os dias se passavam.
Um dia ela acordou e o dia estava cinzento, chuvoso, como se fosse um mau agouro. Teve um pouco de receio de sair de casa, mas sabia que devia ir trabalhar. Foi, e apesar do dia incomum para a época do ano, o escritor novamente apareceu. No entanto, aquele dia ele pelo menos teve a iniciativa de pedir o que comer. Pediu uma fatia de torta de chocolate, o que desapontou um pouco Ana, achando que sua sugestão havia lhe desagradado. "Pelo menos tivemos um avanço" pensou enquanto preparava o café. Notou que pela primeira vez ele parecia estar um pouco desnorteado em relação a sua história, seja lá o que estivesse escrevendo. Naquele dia ele parecia perdido, o que obviamente lhe causava sofrimento. Parecia estar preocupado. Parecia, enfim, um ser humano de verdade. Olhava para todos os lados, talvez procurando inspiração ao seu redor. Até que uma hora os olhares de ambos se encontraram. Ele com uma expressão que parecia perguntar "o que faço agora?". Ela simplesmente suspirou e fez uma cara de pena, como se respondesse que não sabia, que não tinha como ajudar. Esse foi o primeiro contato entre os dois que não fosse meramente "mais café por favor", "pois não". Ana rapidamente desviou os olhos (nunca conseguimos sustentar olhares por muito tempo, é inerente ao ser humano) e virou-se para pegar qualquer coisa que estivesse ao alcance da mão, meio sem graça pelo momento. Apanhou um xícara de café e quando se virou para leva-la até a mesa acabou tropeçando e derramando o conteúdo na camisa de um senhor. Ela pedia desculpas incessantemente, enquanto limpava a sujeira com um paninho úmido. O velho apenas sorria, dizendo que não havia sido nada (na verdade sentia-se muito bem, nem lembrava quando fora a última vez que uma bela senhorita havia lhe dado tanta atenção). Ana olhou de esguelha para o escritor e percebeu que ele sorria, maravilhado com a cena. Ruborizou-se quando viu que ele baixou a cabeça e começou a escrever novamente, como que tomado por um espírito inspirador. Agora ele dera para escrever sobre ela? Que direito que ele tinha de fazer isso? Ana sentia-se invadida. Porém não conseguia fingir raiva, a situação aumentava seu ego imensamente. Sentia-se de certa forma lisonjeada por servir de inspiração.
Quando voltou para casa aquele dia, pegou uma folha de papel e começou a escrever várias idéias e temas para livros, esperando encontrar em um desses o que era usado pelo escritor. Não tendo como saber, resolveu utilizar aquilo tudo. Logo mais estava escrevendo suas próprias estórias. Trocara o hábito de ler pelo de escrever.

O Escritor (parte I)

Faz um tempo eu estou querendo postar algum conto meu aqui. Agora pouco eu simplesmente tive algumas idéias que me pareceram interessantes. Portanto decidi postar a primeira parte do tal conto. Outra hora dou continuidade a escritura.
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Ana se considerava uma garota estranha, mesmo sendo tão comum aos olhos de gente "normal". Não tinha nenhum atributo físico que realmente a distinguisse do resto da humanidade, sendo assim, era apenas mais uma criatura com duas pernas, dois braços e um par de seios, tudo em perfeito funcionamento. E porque haveria de ser diferente? Ela se considerava uma aberração. Achava que por ser tão incomum comparada ao resto não era direito (e nem de grande serventia) que sua aparência demonstrasse o contrário. Pensava que o ideal seria aparentar essa sua esquisitice: imaginava-se com um olho na testa, um par de chifres ou até dois ou três dedos a mais em cada mão. A natureza porém não havia lhe dado a fronte excentrica como sua personalidade. Descobriu alguns anos mais tarde que talvez fosse mais normal do que imaginava (esquecendo, vez ou outra, que isso é tão relativo quanto o tempo). Não era o que as pessoas comumente consideravam bela, mas tinha alguma coisa que arrancava suspiros dos homens (e até algumas mulheres). Ninguém saberia dizer exatamente o que era, simplesmente estava ali, e muitos apreciavam.
Trabalhava em uma cafeteria localizada numa ruazinha sem saída chamada estupidamente de Cafés. Achava que a falta de criatividade para o nome tinha uma explicação óbvia: ele fora a última coisa a ser pensada. Primeiramente o mentor daquele lugar pensou na decoração ideal, na locação perfeita e só então, com as idéias já esgotadas, lembrou-se que o estabelecimento deveria ter um nome. Logo optou pelo óbvio (porém ridículo).
Apesar de tudo sempre tivera um enorme carinho pelo lugar, sendo, antes de mais nada, assídua frequentadora do local. Sempre que podia passava por lá para tomar um café e comer uma deliciosa fatia de torta de morango (especialidade da casa, se querem saber). Um dia, cansada de se alimentar de sanduiches por falta de dinheiro, viu uma placa auspiciosamente pendurada na vitrine. "Procuramos funcionários". Na mesma hora falou com a dona. Não foi necessário muito esforço, tendo em vista que já sabia como funcionava tudo por lá, pelas muitas tardes de ócio despendidas no café.
Uma semana depois já conhecia todos muito bem. Era a queridinha do lugar, pois sempre tivera facilidade para o encanto (mesmo não sabendo disso). Pessoas das quais nunca conversara na vida despejavam rios de confissões em seus ouvidos, o que não era exatamente desagradável para nossa incomum heroína. Satisfazia sua curiosidade, ao mesmo tempo que lhe dava no que pensar nas noites solitárias em sua cama, quando o livro (seus companheiros fiéis) que estava lendo já havia lhe cansado.
Sua vida continuou a mesma durante vários meses, até que um dia surgiu, sem aviso prévio, um rapaz no Cafés. Era um homem relativamente comum. Na verdade beirava o ordinário, não fosse a gravata de um vermelho vivo que usava todos os dias em combinação com o paletó preto. Abriu a porta, sentou-se na mesa mais próxima e acenou para a primeira garçonete que viu. Óbviamente, Ana. Ela anotou seu pedido: uma água mineral sem gás, um café preto e qualquer coisa que deixasse um gosto doce em sua boca. Tendo o poder de escolha em suas mãos e não podendo ofertar nada além de comida (por mais que ela quisesse; Ele não era feio afinal de contas), Ana sugeriu a torta de morango, o que não pareceu comover muito o homem, que assentiu sem muito entusiasmo como se dissesse "tudo bem, como quiser, apenas faça seu trabalho e deixe-me fazer o meu". Esse comportamento blasé irritou um pouco Ana, mas não demonstrou nada. Se ele fazia isso ela também podia. Enquanto preparava o pedido dele, notou que ele havia botado um grande livro na mesa, bem na sua frente. Abriu em uma página específica, pegou uma caneta e começou a escrever. Achou estranho, mas logo concluiu que o rapaz era estudante, provavelmente de alguma faculdade. Medicina? Direito? Sua aparência tão comum e ordinária dizia que era isso. Mas vai saber? Talvez fosse algo menos tradicional. Ana deu de ombros, fingindo não estar interessada em saber. Porém quando foi entregar o pedido, sua curiosidade falou mais alto. Deu uma olhada de leve para o tal livro e notou algo muito estranho. As folhas estavam em branco. Ele era um escritor. Impressionante! Nunca conhecera um pessoalmente. Achava que seres assim só existiam nos campos mais inóspitos da mente das pessoas, assim como personagens folclóricos e criaturas mitólogicas. Para Ana, pessoas assim eram inacessíveis e não podiam, de maneira alguma, serem visitadas em seus mundinhos particulares. De qualquer maneira os fatos lhe provaram o contrário, como ela sempre esperou que fosse em sua vida (Deus nunca falou com ela nem nunca apareceu diante de seus magníficos olhos verdes). Só se arrependeu de não ter demorado mais um pouco ao lado dele, para poder ler pelo menos uma ou outra linha do que escrevera até então.
O rapaz deve ter ficado sentado naquela mesa durante umas duas ou três horas. Quando finalmente começou a escurecer lá fora, ele pegou seu livro, pagou o que devia e foi embora, sem nem ao menos se despedir. Ana ficou boquiaberta com a estranheza daquele dia. Um cara que ela nunca vira na vida entrou e roubou sua atenção durante todo o resto da tarde. Achou injusto. Devia ser proibido por lei as pessoas serem tão interessantes. Ela reclamava, porém não sabia que inconscientemente fazia a mesmíssima coisa com os outros.
Aquele dia quando voltou para casa não conseguia pensar em mais nada além do misterioso escritor. Nem ao menos conseguiu ler nada antes de dormir, porque qualquer coisa já fazia sua imaginação voar alto e pensar em mil histórias que poderiam estar sendo escritas por ele. Sem saber o que fazer a respeito da situação simplesmente desligou o abajur, deitou a cabeça no travesseiro e dormiu.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Sotaque, auto presente e violão clássico (continuação)

Aqui estou eu tomando um chá de camomila totalmente sem gosto e lendo Precisamos Falar Sobre O Kevin. Eu já tinha desligado o pc e só estava lendo um pouco antes de dormir, porém eu tive que deixar isso documentado. No post abaixo eu disse, em outras palavras, que não sabia se esse livro era realmente bom, só que tinha ouvido falar muito bem. Porém agora eu tive a confirmação de que ele é de fato bom.
Página 50, logo no começo da folha:
"Adorava o velho rock básico. Bombástico. Se bem que não irremediavelmente pesado. Lembro que você acabou gostando do Pearl Jam, bem no momento em que Kevin se desencantou com eles... (desculpe)"
Ok, parece besteira, mas uma referência a melhor banda do mundo num livro quer dizer que no mínimo ele merece ser respeitado. O mais legal é que na "primeira parte" desse post eu fiz uma referência a música Jeremy do Pearl Jam, justamente porque a letra lembra mais ou menos sobre o assunto tratado no livro.
Enfim, eu liguei o computador só pra postar isso. Vou voltar a ler meu livro e vou dormir.
Boa noite e sejam felizes.

Sotaque, auto presente e violão clássico

Ontem pelas 11 horas da manhã fui para minha aula de piano então peguei o ônibus. Sentei no banco logo atrás de uma mulher que observava absorta o trajeto pela janela. Não que ela não fosse bonita, mas também não tinha nada de especial. Realmente não me despertava interesse. De qualquer maneira, não fosse a surpresa que ela demonstrava eu nem teria prestado atenção nela.
Continuamos a viagem tranquilamente até que o celular dela toca. Ela pega, atende e quando fala "alô?" me surpreendo. De cara reconheci o inconfundivel sotaque baiano que tanto me agrada. Fiquei o resto da viagem ouvindo encantado ela falar, mesmo que se tratassem de assuntos banais e entediantes aquilo me agradava imensamente. O interessante é que ela passou de um estado relativamente tranquilo e apreciador para algo totalmente enérgico. Ela tentava fazer tudo ao mesmo tempo, ora falando no telefone, ora perguntando ao cobrador se o ônibus já tinha chegado ao destino dela. A "magia" durou até a ligação cair. Pena.
Claro que ela fez algo que me desagrada muito, que é ficar tagarelando ao telefone num ônibus (o que não é pior do que ouvir música, mas enfim). Porém eu relevei por causa do seu sotaque.
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Esses dias eu resolvi me dar um presente. Decidi que ia comprar um livro, afinal de contas fazia um bom tempo que não me presenteava com um. Fui com um amigo no shopping Total dar uma olhada nas livrarias. Estava atrás do livro Porno de Irvine Welsh, que é continuação de Trainspotting, um livro muito bom sobre drogados (resumindo muito) que serviu de inspiração para as cores desse blog. Infelizmente não tinha e também era mais caro do que eu podia pagar. Resolvi dar mais uma olhada e acabei comprando, meio que por indicação de uma amiga minha, o livro Precisamos Falar Sobre O Kevin (se o livro for ruim pelo menos eu sei quem espancar). Pelo que eu li até agora e pelo que me falaram o livro é muito bom. Pelo que eu entendi são cartas mandadas por uma mulher (mãe de Kevin) para um homem (pai do garoto). Nessas cartas ela fala sobre o passado, seu relacionamento com o marido e sobre o filho e a decisão de te-lo ou não. Mais tarde essa criança viria a ser um daqueles perturbados (Jeremy) que entram numa sala de aula e matam meio mundo (não se preocupem que não dei spoiler, isso é revelado logo no início da narrativa). Como estou bem no começo não posso falar muito sobre, mas parece sim ser muito bom.


Nesse mesmo dia do livro decidi dar uma olhada, assim que cheguei em casa, em umas partituras para violão clássico de quando eu ainda fazia aula (e tinha unhas compridas). Redescobri várias peças legais, entre elas o estudo nº 11 de Heitor Villa-Lobos, o meu favorito dos doze estudos para violão. Essa música é extremamente louca, com vários momentos, variando de algo extremamente arrastado, calmo e melancólico para momentos mais tensos e pesados. Vale muito a pena ouvir. Pra quem se interessar, aqui está.


Até mais.

Ouvindo Heitor Villa-Lobos-Estudo nº11

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Malhação e pessoas

Existe um mundo perfeito onde todas as meninas são virgens, os garotos são cavalheiros e nenhum jovem usa drogas para se sentir melhor. Um lugar onde todos os sonhos são realizados e as pessoas são gentis e interessantes. Os pais são compreensivos, os professores são os melhores, não existe discriminação e todos se sentem bem, afinal de contas todos são aceitos nesse maravilhoso mundo feito de sonhos. Mas apesar de tudo existe um pouco de sofrimento. Sofrimento juvenil é claro. Ou seja, coisa passageira. E por conta de pequenas perturbações como essa que existem algumas pessoas que tentam atrapalhar outras. No final todos se sentem bem e viram amigos. O nome desse admirável mundo (não tão) novo é Malhação.
Vai tomar no cu.
Eu ia falar sobre novelas no geral, mas Malhação é um alvo mais específico e interessante, afinal de contas essa porcaria está no ar já faz um bom tempo. Na verdade eu não sei direito o que falar sobre isso, mas xingar já é o suficiente. Então morra Malhação.


É interessante ver como algumas pessoas mudam com o tempo. Vejam bem, não estou dizendo que isso é ruim, afinal uma mudança muitas vezes pode ser boa. Simplesmente acho engraçado pessoas que com o tempo vão se tornando "outras". Botei entre aspas porque as pessoas de um jeito ou de outro sempre continuam as mesmas, só mudam os hábitos, preferências, modo de pensar e de ver as coisas. As vezes essas mudanças podem causar um pouco de espanto e surpresa, porém eu pessoalmente as vezes me alegro com certas mudanças, porque elas acabam sendo muito boas para a própria pessoa e talvez até para as pessoas ao redor. Algumas até ficam mais interessantes.
Isso nos leva ao outro assunto: pessoas interessantes.
Nos últimos anos eu tive muita sorte em relação a isso, então conheci muita gente bastante interessante. Essas pessoas sempre acabam tendo uma forte influência sobre mim, seja na maneira de pensar, agir, falar e tudo o mais. Alias, as vezes uma pessoa dessas acaba sendo um fator muito forte sobre a mudança que uma pessoa pode sofrer.
Não sei muito bem porque estou falando sobre isso, mas só quero dizer que se por acaso uma pessoa dessas aparacer na sua vida não hesite em conhece-la a fundo, porque raramente não vale a pena. Aproveite essas pessoas ao máximo, porque se ela for realmente de valor um pedaço dela sempre vai estar contigo e tu será eternamente grato por isso. Todos podem nos ensinar algo, por menos que pareça.
Aproveitando o espaço, gostaria de postar dois vídeos muito legais. O primeiro é a Melina, vocalista da minha banda (Burn It Up!) cantando a música All I Wanted do Paramore. Espero que vocês gostem, porque eu gostei!
O segundo é o clipe novo do Paramore, que na minha opinião é o melhor deles até hoje. Sendo que a música (Careful) ajudou bastante, porque pra mim é a melhor do novo álbum.
Bom proveito para vocês, boa noite e perdão por usar tantas vezes a palavra "pessoas".


Ouvindo Lynyrd Skynyrd-Free Bird

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Show da Pitty e CB

Ontem foi o show da Pitty. Peguei meu primo na casa dele e depois fomos para frente do Opinião onde por um acaso eu encontrei um amigo meu. Lá eu pude constatar que existe realmente muito preconceito em torno da cantora. Todas as pessoas que ouviram eu falar que ia no show dela acabaram fazendo alguma brincadeira. No fim das contas foi bem engraçado, mas enfim.
Pouco antes de entrar encontrei uma amiga minha e logo depois entramos. Lá dentro estava um inferno: quente demais, gente demais, lugar de menos.
Por sorte encontramos um lugar onde dava pra ver razoavelmente bem o palco.
Esperamos pouco tempo para o começo do show, nem deu pra cansar. Ela entrou finalmente e então eu pude ver que valeu a pena ter ido. Me desculpem a expressão mas... Ela tava gostosa pra caralho! Não achei fotos (para a infelicidade dos homens), mas depois posto um vídeo. Dai caso não goste da música, apenas tire o volume e aprecie.
O show foi legal, a performance da banda foi muito boa. Eles davam umas viajadas legais nas músicas e a Pitty usou uns pedais de efeito na voz que deixaram a coisa toda mais interessante. Porém não deu pra curtir 100% o show por que realmente tinha muita gente lá e o pessoal passava por onde estávamos todo o tempo, seja pra ir no banheiro ou comprar ceva. Deu vontade de dar um tiro nuns vários.
Depois do show fiz uma coisa que nunca tinha feito antes em dia de show no Opinião: fiquei por lá na Cidade Baixa. Foi legal, conheci algumas pessoas interessantes e de quebra ainda sai com o apelido de Dio. Pois é.


O único problema desse vídeo é uma guria filha da puta que canta muito alto e muito errado e isso destrói completamente o som. Enfim, nada é perfeito.
Até mais.

Ouvindo Warlock-Midnite in China

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Auto-inveja e outros traços de uma personalidade doentia

Eu sou invejoso, admito. Sinto inveja por diversos motivos que nem vou citar aqui. Porém eu tenho um sério problema, eu sinto inveja de mim mesmo! O que acontece é que eu tenho predileção por certas coisas que são minhas e quando vejo que outra coisa minha é melhor que essa coisa da qual prefiro eu sinto inveja. Entenderam?
Vou dar um exemplo bem nerd: cartas de Magic. Tenho dois baralhos, um de cartas brancas e verdes e outro de zumbis. Quando eu recém tinha criado eles decidi jogar sozinho pra testar. Prefiro o de zumbis, porém as vezes acontecia de o outro ganhar e eu ficava com inveja. É bem idiota, eu sei. Sei lá, sou meio doente mesmo.
Outro bom exemplo são meus blogs. O See Me Play tem quinze seguidores enquanto este tem apenas oito! Agora me pergunta qual que eu prefiro? Pois é (alias, peço encarecidamente para você que tem um blog, por favor, me siga! Pode nem ler isso aqui, mas é sempre bom pra fazer número).
Provavelmente se um dia eu tiver filhos as coisas vão ser assim. Pobres coitados.
Existem certos aspectos da minha personalidade que realmente me assustam, como por exemplo conversas fictícias. Eu fico imaginando diálogos que nunca existiram ou vão existir com pessoas que talvez eu nem conheça direito ou conheça tão bem que eu simplesmente sei que aquilo seria impossível. Na verdade isso é bem confortante, tendo em vista que as respostas que elas dão para mim são coisas que eu gostaria de ouvir.
Mas não é só isso. Imagino situações também e elas nem sempre são agradáveis. Isso acontece principalmente na hora de dormir, antes de realmente pegar no sono. Me sinto meio tosco contando essas coisas, mas fazer o que se eu gosto de denegrir a minha própria imagem.
Outra coisa é que sinto ciúmes de amigos (as). Na verdade sou um cara bem ciumento. Algumas pessoas diriam que sou possessivo e isso é por causa do meu signo (escorpião). Mas como acho isso tudo uma grande baboseira melhor deixar para lá.
Será que essas coisas são mais normais do que eu imagino? O que será que Freud diria sobre isso? Melhor nem pensar nisso.

"Esse cara é doente", isso que ele diria

Mudando de assunto, gostaria de comentar sobre a trilha sonora de "O Fabuloso Destino de Amélie Poulain". Eu estou meio viciado nela porque é realmente muito boa! Ela foi feita por um francês chamado Yann Tiersen e vale a pena dar uma conferida, principalmente se tu gosta de músicas instrumentais. Caso ainda não tenho visto o filme, aproveite para vê-lo e conhecer a trilha sonora dessa maneira. Essa é a melhor música da trilha e um dia eu ainda vou tocar ela, custe o que custar!
E como eu imaginava, aquela história de uma resenha de álbum por semana falhou miseravelmente. Fazer o que.
Até mais ver.


Ouvindo Yann Tiersen-La Valse Des Monstres